4 de junho de 2008

Acontece o tempo fora de tempo

Uma noite ainda jovem abraçava-os com o som das folhagens densas das árvores que se alinhavam na estreita rua. No céu a cor azul de um luar como pano de fundo onde brilhavam estrelas… muitas estrelas. Do lado de lá da cidade imaginava-se o ruído do silêncio que se confunde com o sono das searas. Se um rio enlaçasse a cidade sentir-se-ia no ar o aroma fresco da água numa noite de verão. E se nas margens dos rios as pedras se amontoassem umas sobre as outras, abrir-se-iam caminhos para o reencontro. E no reencontro surgiriam conversas e apertos de mão.

Sentado numa cadeira gasta de verga acomodou-se no sentido da noite, enrolando-se numa brisa pouco fresca que lhe tocava o tronco nu. Numa mão um copo meio vazio e noutra um cigarro que ardia com vontade própria. Os pássaros aninhavam-se nas copas das árvores onde adormeciam balanceados pelo vento. A noite crescia alucinada. A cada instante o silêncio matava as ruas secando-as de gente. Algumas janelas abertas acolhiam o vento fresco na esperança de um arrefecimento das casas. O dia já se notara longo e quente.

Acontece o tempo fora de tempo. Uma mão leve e suave percorria-lhe o tronco, começando pelos ombros e depois o peito. Acontece o tempo fora de tempo. Um beijo tocava-lhe os lábios e depois o tronco. Acontece o tempo fora do tempo. Um grito de prazer seguiu-se ao arfar apaixonado do desejo. Acontece o tempo fora de tempo. Dois corpos dão-se um ao outro como desespero. Um e outro cruzam-se no silêncio da cidade. Acontece o tempo fora de tempo. E nesta cidade nada mais acontece.

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