8 de novembro de 2010

POEMA E DESENCONTRO

Nos teus lábios sinto o desacerto entre nós, 
como se fosse um beijo 
feito do silêncio que nos arreda. 
Já não fechas os olhos, nem me acaricias a pele. 
Transformamos os impulsos num costume, 
sem acasos. 
Consumimo-nos um ao outro 
sem perceber que o tempo nos consome. 
Já não te sentas ao meu lado, 
nem dizes o meu nome. 
Perdemo-nos no sossego da planície, 
cada um para o seu lado, 
com uma estrada ao meio 
e beijos apagados a fingir que são beijos. 
E nos lugares desencontramo-nos 
com os olhares sumidos, 
perdemos os lugares e os crepúsculos, 
perdemo-nos um ao outro 
numa mágoa taciturna.

3 de novembro de 2010

às vezes penso em ti. sim, de quando em vez, muito espaçadamente. não é coisa boa nem coisa má. são pensamentos soltos e bassos. porque me fizeste acreditar que nem lembrar faz sentido. para além de me convenceres que nem amor existe. e quase que conseguiste. mas penso em ti, como dizia, espaçadamente. uma imagem aqui, outra preocupação acolá e muita curiosidade. depois o pensamento vai-se ainda mais ligeiro. passageiro, é como se diz. e quando percorro as ruas abertas e largas já não olho ao topo dos edificios na esperança de te rever. nem confundo as árvores da cidade com as do campo. as ruas são todas iguais desde que me levem ao centro do largo. lembras-te, do largo, o centro do mundo, que fantasiamos uma ou outra vez? agora é outro largo e mais central, mais, como dizer, mais largo, mais pessoal e infinito como a esperança. e as árvores são as árvores, as do campo, claro. perfumadas e coloridas, desalinhadas. porque a natureza não alinha. e são resistentes, sabes?

POEMA EGOCÊNTRICO

já não me inquietam as palavras nem os gestos
nem os outros errantes que me afrontam por despeito
nada voltará a ser como dantes nem palavras nem gestos
nem sequer o meu corpo refeito das ausências e dos desamores
nem a desesperança me amedronta ou a esperança me deslumbra
que agora sou cinzento às cores coragem sem medo da afronta
luz branca-suave entre a penumbra