31 de agosto de 2007

surges...

surges na linha do horizonte
onde o crepusculo está a acontecer
vens na cor do fogo

30 de agosto de 2007

Ainda aí estás?

penso que ainda aí estás
do lado de lá da janela indiscreta
sorrindo com as palavras que escrevo
com a intenção de te abraçar
como se fosses o único corpo na minha vida
este poderia ser um poema como todos os outros
que escrevi para que sentisses as minhas mãos
a tocar o teu suave rosto
onde os teus olhos costumavam saltitar de alegria
quero pensar que ainda aí estás
no lugar de onde se avistam as memórias
sobre o parapeito da janela indiscreta
talvez ainda aí estejas
aguardando na penosa dor da ausência
e se ainda aí estiveres
peço-te que me esperes serenamente
que um dia surgirei na forma de uma palavra

A cidade esquecida

Vivo distante dos lugares de sempre. Dos espaços que se mantém estáticos desde que os visitei pela última vez. Aos poucos, porque agora a disponibilidade é maior, vou dando conta do tempo que passou sem que regressasse...

A vida levou-me a outros hábitos e neles me prendi sem o propósito de esquecer o que me rodeia. Em Beja, entre ruas vazias e silêncios ensurdecedores, existem lugares que vêm do passado como o Museu Rainha D. Leonor onde Mariana Alcoforado se enamorou, A Igreja de N.S.ª dos Prazeres onde uma exposição de Arte Sacra nos conduz ao histórico legado religioso, entre outras igrejas, como a Sé, a da Misericórdia, A ermida de Stº André, a Igreja de S. Francisco ou de Stº Amaro, e o Castelo, claro, de onde emerge uma torre rumo ao céu que avista a planície extensa do Alentejo.

E a estes lugares que me lembro de ter visitado quando muito jovem não tenho voltado. É pena, perco mais com a distância do que esses espaços que ainda vivem sem mim e sem os outros... Por enquanto!

Raios de Lua

Um vidro alto, fixado entre estruturas de ferro e de betão, separava-nos do lago raso e brilhante. Raios de lua rasgavam a tranquilidade da água. Nas margens pontos de luz milimetricamente colocados prolongavam a extensão do lago, para além do passadiço central. Sentados à mesa desfrutavamos de um jantar a dois. Só os dois. Os olhares fixavam-se um no outro acompanhados de largos e romanticos sorrisos.
Um jantar a dois não se faz sem um bom vinho. Tinto, da cor do calor ardente da paixão. Tinto, da cor intensa do sangue que acelera o desejo. E tudo o resto são gestos e palavras... E um brinde à leveza das manhãs em que acordo na sua companhia.
Não importa a conversa que fluiu eloquente, não interessa se não o brilho do seu olhar deslumbrando o meu. E um beijo, apaixonado e intenso, no topo do mundo, sobre o lago raso e calmo onde navegavam tranquilos os raios de lua. E um beijo, prolongado e doce, na frescura da brisa nocturna.

Daqui...

Daqui seguem palavras precisas
Pelas ondulantes searas douradas
No sentido do teu coração vermelho

Gotas de água na tarde calma
Brisas leves de sílabas acentuadas

29 de agosto de 2007

Leve manhã

Tão leve surge a manhã
Que a confundo com ar
E respiro-a fresca
Em cada beijo teu
Tão leve surge a manhã
Que a levo no meu peito
E passeio-a no teu corpo
Onde me aguarda um lugar perfeito

Poema de Regresso

Regresso aos poemas com a tranquilidade do teu olhar
Ainda que as palavras se repitam na intenção de te amar
Sigo as linhas direitas do caderno que me assiste
Como se fossem estradas que me guiam ao teu encontro
Na impoluta vontade de reafirmar o que existe
E nas rimas soltas ou fixas resisto ao confronto

Poema sobre Ti

Inebriado pelo cheiro do teu corpo
Caminho impaciente ao teu encontro
Escondes-te no foco da lua
Sobre o céu azul de uma noite nua

Tudo se centra em ti
Como se fosses o epicentro
De um terramoto que me abala

Reflexão sobre Beja

Com vagar passeio pela cidade que se centra nas planícies como se fosse uma ilha. A cidade está deserta na noite de vento. Caminho sem dirigir o passeio a um local especifico. Vou ao sabor dos passos e no conforto da companhia. A cidade é nossa. Raras vezes alguém interrompe o silêncio da noite fria. As ruas estreitas parecem neste momento largas avenidas. As casas parecem distantes da vida. Fechadas, separando-se da noite. Conduz-me um vento forte que agita as copas das árvores, que levanta as folhas secas caídas no chão. E esse vento leva-me até um banco de jardim abandonado. Acendo um cigarro como desculpa para descansar. Olho em meu redor e tudo acontece no silêncio estático de uma cidade vazia.
Pela manhã a cidade não é assim... As pessoas agitam-se nas ruas, sobrepõem-se nas calçadas estreitas dos passeios, enchem largos com sorrisos feitos de velhos hábitos. Pela manhã a cidade ergue-se na planície com sons indefinidos de uma multidão. No centro as pessoas cruzam-se e cumprimentam-se, as lojas, os supermercados e os cafés são ocupados na rotina matinal dos afazeres. E tudo isto dura uns instantes, como se a manhã da cidade fosse um fósforo que arde rápido até ao fim. Depois, quando chega a tarde quente as ruas são mais parecidas com o vazio nocturno. A cidade esgotou-se no frenesim matinal.
O que nos resta? Que fé vã nos acalentará a esperança de um futuro diferente? Quando seremos suficientes para que a cidade seja plena de vida?...

28 de agosto de 2007

Musa IV

Hoje queria oferecer-te o mundo! O mundo das coisas boas, das palavras doces e meigas. Desejava preencher-te com as imagens mais belas e exclusivas, levar-te aos sonhos sem destino pré-definido. Queria poder ter o poder de te dar um momento de felicidade para que os teus pensamentos fossem da cor azul do dia em que o teu sorriso passeia nos olhares dos outros. Em que o teu sorriso enebria a minha alma.
Hoje queria que ouvisses apenas as coisas boas!

Um dia

Queria tanto poder olhar-te nos olhos, seguir-te como quem segue um traço de água fresca, e passar os dias restantes no aconchego do teu abraço. E nos teus braços, entre suspiros de conforto, imaginar os dias que ainda faltam... tranquilamente, com o prazer inesgotável de te ter.
Talvez um dia entendas o que quero, talvez nesse dia tudo possa ser como desejamos...

Esclarecimento a Joia

Não é minha intenção responder aos comentários dos visitantes deste Blogue. Pelo contrário, desejo as opiniões livres, num espaço de respeito e de tolerância. O objectivo deste Blogue é tão só o da expressão de pensamentos e de sentimentos que se justificam pela experiência do seu autor (ainda que jovem). No entanto, reconheço a pertinência das opiniões manifestadas pela visitante Joia. E mais, confesso admiração pelo que pensa, embora sempre em tom discordante com o meu. Adoro o sufismo.
Primeiro importa esclarecer alguns aspectos para compreensão do estado de espírito do autor:
No que respeita ao entendimento do Amor, e sendo abrangente e infidável a sua definição, considero que em tudo existe um oposto que justifica a existência de algo: O bom e o mau; o branco e o preto; o dia e a noite; a alegria e a tristeza; etc..
Ora, nem tudo tem de ser exclusivamente amargo, ou depreciativo, podemos ver as coisas na nossa perspectiva pessoal, ou abordá-las num sentido mais lacto, sendo que as entendemos como nos são colocadas à disposição da nossa capacidade de adquirir conhecimentos. No meu caso, e das minhas opiniões, tudo é expresso numa perspectiva muito pessoal.
Uso muitas vezes a metáfora, criando imagens figurativas, e outras vezes escrevo com a intenção objectiva de dizer o que realmente penso, sem outras interpretações possíveis.
É saudável a Rotina do Amor? Sim, e esta não pode ser entendida como um acontecimento estático, negativo e depreciativo. A rotina pode ser a dinâmica de um espaço próprio capaz de valorizar o Amor, dar-lhe vida, faze-lo viver, sem que nisso exista uma habituação mental ou material de desgaste. Aguardar por alguém, quando no acto da espera pode haver o prazer da saudade, e multiplicar o desejo de se estar com esse alguém é sem dúvida positivo. De outra forma teria escrito Rotina no Amor, e aí entender-se-ía a perspectiva negativa.
O Amor é uma Convicção? Sem dúvida! De outra maneira existiria a percepção do que se sente? Teríamos certezas? E na primeira dúvida, desistiriamos? Importa esclarecer que um sentimento é uma convicção, e não o entenderiamos como tal se não fosse a necessidade de esclarecer - constantemente - o que sentimos.
Gosto do sufismo. Admiro as opiniões divergentes. Resta-me deixar o convite para que volte sempre.
Obrigado

27 de agosto de 2007

Bem sei do tempo

Bem sei do tempo, das horas e dos dias, em que tudo se transforma num eterno desespero. Bem conheço esse tempo, em que me aconchegarei num manto largo de silêncio. Bem sei que existe o tempo que nos separará, como se fosse uma ponte infinita coberta por um céu de névoa densa. Bem conheço o sentido do tempo, esse que nos conduz à amargura de todas as dúvidas. Bem sei que é importante tempo para te esperar como se essa fosse a única rotina do Amor.

Deixo

As palavras repetem-se nos ecos e gastam-se no tempo da tua ausência. Deixo as palavras tomarem o caminho fácil das futilidades. Deixo as palavras secarem como folhas na página de um livro. Deixo as palavras, incapaz de deixar o constante pensamento...

Um poema teu

Um poema teu
nasce na claridade do teu olhar
e depois,
bem depois,
constrói-se nos gestos finos das tuas mãos
e em cada rima acentua-se
na certeza dos teus sentimentos

e de ti nasce um poema
o teu poema

26 de agosto de 2007

Domingo

Hoje é domingo. Um domingo igual aos outros, numa cidade diferente de todas as outras. Aqui as ruas gozam o descanso dos passos pesados, das lentas correrias. Os passeios alinham-se em sossego junto às casas enraizados em frondosas árvores. A cidade parece não existir. Apenas um ou outro carro rompe o silêncio da estrada empedrada. Ouvem-se os pássaros - esses frágeis resistentes - a esvoaçar entre os telhados altos das casas brancas. Hoje a cidade repousa no sossego do silêncio que construiu domingo após domingo. As pessoas são raras figuras que percorrem as ruas desertas de vida. Estamos em Beja. Hoje é Domingo...

25 de agosto de 2007

Sem fim

Queria tanto que este momento não tivesse fim. Queria repeti-lo se pudesse na tua companhia. O ar abafado e húmido da tempestade que nos estragou a tarde persegue-nos na noite que agora chega. E se amanhã chover? Podemos estar juntos para que possa contemplar o teu frágil sorriso?

Ignorância

Na madrugada, quando ao longe se avistavam raios rasgando o negro da noite, surgiu o seu rosto de silêncio desenhado na brancura da lua. As horas passam, umas sobre as outras, como se fossem ondas sobrepostas. Sinto-as em cada instante, magoando o sentir, criando dúvidas que julguei não existirem. Adormeço na manhã cinzenta e chuvosa sem saber o que vai acontecer.
Os sons tenho-os na minha cabeça como rumores distorcidos, palavras vãs. E os gestos? Onde fica a intenção de um abraço? O que fazer ao desejo de um beijo? Deito-me numa almofada de interrogações... vacilo na vontade de um telefonema.
Não sei o que se passa e isso é pior que o desamor. É a ferida crua da ignorância que me atormenta o espirito. Que me desiquilibra os passos. Que me pesa no corpo.

Praça da República em Beja II

E não foi preciso aguardar muito... Um novo ciclo iniciou-se na boa imaginação e no bom gosto. O Praça da República em Beja está renovado e pronto para surpreender ainda mais. Com um novo endereço e o mesmo espirito...

Aconselho uma visita às cores, às imagens, e claro, às palavras, em:

http://www.pracadarepublicaembeja.net/

24 de agosto de 2007

Praça da República em Beja

Numa visita diária ao Praça da República em Beja fui confrontado com o anuncio do fim de uma etapa. Entendi que se está a renovar e que este espaço poderá apenas criar em nós o entusiasmo para que o revisitemos vezes sem conta com redobrado interesse. Outra coisa não aceitaria que acontecesse...
Este Blogue (Praça da República) tem sido uma lufada de ar fresco na abafada sociedade em que vivemos. Não sou dos que o criticam porque é polémico e audacioso nas opiniões, pelo contrário, essa atitude estimula a reflexão e permite aos que não preferem a opinião única um espaço de reflexão e de opinião de que carecemos na nossa cidade. Divergir criticamente é substancialmente preferível a convergir acriticamente.
Junte-se à opinião o bom gosto pela fotografia, a excelente selecção de poemas, a diversificação nos temas abordados, e sem dúvida alguma e mais importante que tudo o carinho e o amor de um cidadão pela sua terra e num só clic temos um blogue que nos habituou à frescura das ideias e das imagens.
Aguardo que o regresso seja para breve. Aguardo, sabendo que o sucesso se manterá!

Apenas um Adeus...

Recebo as suas palavras definitivas anunciando o fim. Sinto que não dizem tudo o que sente. Apenas um Adeus. O Adeus que temia ouvir.
Decido ficar em silêncio... Emudeço os sentimentos que se revoltam no meu corpo. Cubro a face para que não se apercebam que estou diferente, doído, magoado, ferido na morte da despedida...
Releio o que me escreveu no desespero de uma ténue esperança de que um outro sentido possa alterar o rumo dos acontecimentos. Releio até à exaustão, compreendendo por fim que as águas se separaram em leitos distintos. Apetece-me dizer-lhe com voz meiga e serena "Fica!" - mas temo o confronto, temo escutar os seus argumentos, temo conhecer as suas amarguras. Mas não aceito que me diga Adeus! Não me resigno ao silêncio. Não abdico deste Amor!
A partir de hoje o que tenho é muito menos. Serei menos do que se possa esperar. Uma parte de mim desfaz-se num sublime lugar que desconheço...

23 de agosto de 2007

O Anel de Saturno

Há coisas que nos parecem inatingíveis. E que quando as desejamos confundimo-las como se fossem sonhos de onde extraimos o sumo da utopia. E perseguimo-las como se fizesse sentido segui-las, dar-lhes forma e essência.
Um poeta, um grande poeta, escreveu para a sua amada musa o desejo de lhe oferecer o anel de saturno. Sim, esse imenso e impalpável anel que paira na sua órbita. Temeu o Poeta, esse grande Poeta, que fosse o anel demasiado pequeno para servir no dedo da sua musa. Anteveu o Poeta, esse grandioso Poeta, que na utopia do seu amor, e até na convicção do seu sentimento, a imensidão da sua amada musa era infinita...
Vivo esta sensação de imensidão. Vivo este sonho que me mantém acordado. Que me segura na terra, prendendo-me à vida - enlaçado num Anel de inquestionável valor!
Jorge de Sousa Braga (n. 1957)
POEMA DE AMOR
"Esta noite sonhei oferecer-te o anel de Saturno
e quase ia morrendo com o receio de que ele não
te coubesse no dedo"

Parque da Cidade III

Aproxima-se o final da tarde, a brisa que percorre a cidade refresca-se ainda mais nos campos das sombras que crescem a cada instante. No caminho estreito que separa o parque da cidade agitada surgem pessoas que caminham, e outras que correm, e outras que passeiam nas bicicletas. Vejo-os ao longe por entre os cortes das sebes, como se fossem figuras animadas numa imagem desfragmentada. As cadeiras da esplanada vão sendo ocupadas com o entardecer. Ouço ruídos, conversas distorcidas que o vento levanta dos lugares de onde não deveriam ter saído. Aqui nasceu um novo centro da cidade...
A cidade cresceu, digo-o para mim num pensamento de espanto. A cidade cresceu e de tanto julgar que a conheço não dei conta de que cresceu. Por vezes passo nos lugares e páro admirado pela forma dos edifícios que os meus olhos vão descobrindo. Estão lá desde sempre, muito antes de mim. Mas não lhes dei importância, não os olhei - talvez porque não julgasse importante faze-lo na altura. Agora olho-os como se alguém os tivesse colocado nesses lugares para me confundir.
Conforto os pensamentos nostálgicos num gin tónico - limão q.b. e muito gelo.
À minha volta, espalhados na extensão do Parque, existem pontos pequenos verdes a assinalar o lugar das futuras árvores adultas de amanhã. Não sei se são plátanos. Eu gosto dos plátanos: altos e fortes, de folha larga e áspera do pó. Gosto de plátanos, como aqueles que circundam o museu, e os outros que antes se debruçavam no Jardim do Bacalhau sobre a água que jorrava no largo geométrico e azul. Nessa altura adormecia nas suas sombras. Ali construíra o sonho de um largo de árvores frondosas onde cabia o mundo, todo o mundo...
Espero pelo crepúsculo que tarda em chegar. Vem lento e sem pressa. Vem de azul e fogo no limite da planície. Aguardo por ele. Sorvo o último gole de gin tónico. Fumo um cigarro enquanto me despeço do Parque da Cidade!

22 de agosto de 2007

Parque da Cidade II

Há uns anos atrás as noites gastavam-se até à exaustão das horas tardias nos pequenos largos, praças e jardins do centro da cidade. Mas isso era no tempo em que o centro tinha vida e que as suas ruas estreitas e altas saltitavam como se fossem as artérias do coração da cidade. Nessa altura, ainda me recordo, a cidade, que entretanto se deixava adormecer na periferia, vinha ao centro cumprimentar quem por lá passeava. Hoje essas ruas são apenas estreitas e altas, caiadas na cor branca do silêncio.
Acordo deste sonho nostálgico com o grito libertino de uma criança que utiliza a bicicleta como um objecto de malabarismo urbano. As rãs silenciam o seu coaxar enquanto se perde na distância do caminho misturado com gravilha o som do jovem malabarista urbano. Decido caminhar mais um pouco até à esplanada junto ao lago. A água refresca-nos os pensamentos, deixa-os fluir como nascentes de onde brota o límpido e sagrado elemento da natureza.
Sento-me numa cadeira sob um dos chapéus de palha que cortam o sol na forma de uma moeda e aguardo. Aguardo não sei por quem. Mas sinto que aguardo.
Antigamente esta zona parecia distante da cidade. Vir para estes lado, mesmo que numa bicicleta é uma aventura que preparavamos. Digo aventura porque o nosso espaço era o centro da cidade, junto ao largo do museu, e sair de lá para vir até este ermo era para os aventureiros. Regra geral vinhamos para fazer nada. Sim, para fazer nada. Vinhamos onde já não era cidade. Mas agora os carros trazem-nos com facilidade. A água chama-nos para repousar o olhar...

21 de agosto de 2007

Parque da Cidade I

Dos espaços leves e verdes que a cidade permite disfrutar escolho para uma tarde de introinspecção o Parque da Cidade. A água rasa no lago amplo, o verde a camuflar o tórrido dia e o restolho do lado de lá da estrada agitada, as pessoas que se resguardam nas sombras do betão e o coaxar das rãs entre juncos emergindo de um lago mais pequeno e estreito.
Sento-me num desses bancos para escutar o coaxar das rãs e o zumbido das libelinhas e de outros insectos que sobrevoam a água esverdeada. A esta hora o Parque é mais intimista. São poucos, os loucos como eu, que se fazem ao calor de uma tarde de Agosto. Hoje corre uma brisa pela cidade e aqui sinto-a tocando-me a face.
Ao levantar o olhar apercebo-me de uma nova cidade. Do lado de lá do lago um bairro inteiro foi emergindo sem que reparasse nele com tanta atenção. A mata, onde os altos eucaliptos refrescam um circuito de manutenção foi-se encolhendo com o tempo para que à sua volta crescessem prédios e outros edificios. Mas ainda lá está, a ensinar-nos a respirar.
Recordei-me das tardes traquinas que passavamos no Jardim Público, das noites quentes que por lá passamos na conversa, sentados num banco de jardim, até que o guarda tocasse o pequeno sino anunciando o encerramento. Há umas noites atrás passei a pé junto ao Jardim Público e estava fechado. Os portões altos e verdes de grades encostavam-se um ao outro presos nas intolerância de um cadeado. Ainda bem que o Parque da Cidade não tem portões... Aos poucos fastamo-nos do centro, dos lugares do passado e da memória, daqueles que cultivamos na esperança de que nos sobreviveriam. Mas lentamente afastamo-nos deles. Ou afastam-nos deles.

20 de agosto de 2007

De volta à cidade

Regresso aos dias de rotina. Aos lugares comuns que conheço de cor. Às palavras gastas pelas circunstâncias. Queria tanto que a vida não fosse apenas isto...


Reencontro-me com o centro da cidade, com as ruas estreitas e altas que sobem e descem para que o coração da urbe se encontre com as planícies. Reencontro-me com outros rostos parecidos ao meu, que se perdem nestes dias de regresso ao quotidiano. As ruas ainda passeiam no vazio do calor de verão, as lojas ainda se esgotam na solidão e as árvores repousam serenas e resignadas a ausência de todos nós.


Regresso sem que tenha mudado. A cidade aguardou por mim, sem que tenha mudado...

19 de agosto de 2007

O que basta

Bastam-me as horas que me restam
As suficientes ainda para te viver
As que morrerão no fim de mim
As que sofro para te conhecer

Breve, como um instante de ar
Basta pouco, daqui até ao fim
Tão pouco que me inquieta não o saberes

Último Poema

As marés

Não sabem os que não me conhecem a dor dos reencontros. Os reencontros com pessoas que me tocam. Que me levam no sentido limpido do olhar. Hoje reencontrei-me com um grande, grande amigo.

A vida leva-nos como se fosse uma maré - ora vaza, ora enche - e nós somos ondas de espuma que se esgotam no areal denso que nos acolhe na desesperança. E entre as vidas de cada um geram-se mundos diferentes. Ondas separadas que têm o único destino de morrerem na praia, tal qual como náufragos...

Quero acreditar que a vida nos leva para outros oceanos. Quero acreditar que numa vida existem várias vidas - como numa maré infinitas de ondas. E nesta convicção me mantenho, como se fosse o Lugar Convicto da minha vida!

E para o Grande Amigo tudo!...

O teu silêncio

Existem silêncios...

quando a cidade adormece
e a madrugada me cerca
quando se esgotam as palavras
e os outros se calam
quando os pássaros emigram
e os rios secam
quando as planícies estão de negro
a vida finda
quando a música acaba
e as árvores se curvam

E existe o teu silêncio...
A mais profunda dor!

18 de agosto de 2007

Momento

Lá fora a cidade passeava-se nas ruas de silêncio de uma tarde de verão. Entre as paredes grossas e frescas, o seu corpo foi até ele desenhando trémulas formulas de desejo. Os seus olhos recortados entre folhas brancas e puras de papel eram como faróis que se podiam avistar num navio ao largo. Beijaram-se, como se fosse a derradeira vez. Mesmo sabendo que era apenas o inicio de tudo...
O vento quente batia de quando em vez nas portadas da janela entreaberta fazendo irromper na pequena sala os cortinados leves como se fossem flamingos a levantar voo. Uma orquídea branca segurava-se resistindo ao calor, num pequeno vaso sobre o aparador. Sentados no sofá ouviram as palavras um do outro que ecoavam a casa como eternas promessas de amor. Promessas de que não se duvida quando os olhos brilham e os corpos se atraem como imanes.
Desesperadamente, apaixonadamente, seguiram o caminho do desejo crescente até que a última gota de água secasse nos corpos suados de prazer...

17 de agosto de 2007

Lugar Etéreo

Já está disponível na integra a edição de LUGAR ETÉREO. Pode ser consultada no campo de PUBLICAÇÕES, do lado esquerdo do ecran.

Não

Recordo-me de uma tarde junto ao mar em que uma brisa, mais áspera que o habitual, se desfazia nos nossos corpos quentes. Veio à memória desses dias os seus olhos brilhantes que ofuscavam o sol e os nossos corpos inquietantes que desejavam o areal como se fosse o mais amplo leito para que o amor repousasse. Lembro-me, na frente limpida das lembranças, de um beijo timido e de abraços disfarçados, das mãos que se tocavam à distância. Lembro-me do segredo, da inquietação sobre os olhares dos outros. Recordo-me da intranquilidade que morria em cada beijo.
Lembro-me, Recordo-me de tudo e não quero regressar a esses pensamentos. Não quero voltar a esse lugar incómodo!

16 de agosto de 2007

De cada vez

De cada vez que o tempo passa sinto o que cresce na sua ausência. Sinto-o como se fosse perceptível aos meus olhos. O seu sorriso quando me olha. O seu olhar recortado e brilhante. A sua boca contornada pelos lábios mais doces que beijei. E as sua mãos? As suas mãos na minha pele quente de desejo.
Há coisas que não esquecemos. Que nos ficam na memória. Que nos eternizam no tempo. E cada vez que o tempo passa entendo com a clareza dos sentidos mais apurados que o meu ser se destina a si.
Não será preciso convencer-me de outra coisa. Basta-me a sua companhia...

15 de agosto de 2007

Hoje

as manhãs são como gotas de água
que me refrescam os sentidos
acordo com o teu sorriso no meu olhar
e hoje esqueci o sofrimento da mágoa
sou o que me levas a ser nas asas do amor
em cada instante de paixão quero amar

14 de agosto de 2007

Musa III

Podem as palavras soarem ridiculas. Podem os outros não as levarem a sério. Importa-me o que sinto hoje:
AMO-TE!

Antes

lembro-me da cidade branca como uma ilha sobre a planície
onde as searas verdes como o mar lhe tocavam.
lembro-me de cada rua onde corria na meninice
e de cada rosto com que me cruzava.
hoje sinto a nostalgia da vida, da vida inteira
que me cercou num lonquinquo passado.
e nas ruas de hoje os rostos passam ao lado
de uma cidade antes companheira.

Nada acontece

sigo os pássaros no céu azul do dia lento
que se definha nas ruas vazias da cidade
onde o tempo não passa com o vento
e nem o tempo mata tanta saudade

hoje é o dia em que nada acontece
por aqui tudo se tornou itinerante
o dia expira enquanto a noite aquece

13 de agosto de 2007

Sempre

Sempre corres para mim como se me quisesses. Como se me quisesses tanto. E sempre que o fazes o meu corpo anima-se. Agiganta-se. Cresce nas tuas mãos. Refresca-se nos teus lábios. Adormece no teu peito.

Escolher o amor

Se fosse possível ter escolhido o amor, ter decidido quem amasse - hoje como ontem e para sempre - e os meus sentidos seguiriam o rasto do teu sorriso. Quando olho para trás e penso nas horas em que me resignei amargamente ao desamor e à desesperança, arrependo-me de não te ter imaginado. De não ter acreditado que fosses real. E agora que olho em frente e que o teu rosto se espelha nos dias que o meu ser percorre arrependo-me de não ter sabido que então já existias.
Talvez o amor não seja apenas um encontro. Talvez o amor não seja tão só um momento. Talvez precisemos de sentir o seu lado escuro e sombrio para que aprendamos a amar.
O amor é uma convicção!

Crepusculo a dois

hoje o crepúsculo teve a tua companhia
e nos teus olhos as estrelas brilharam
enquanto a noite renascia
e contigo o crepusculo tem cheiro e sabor

10 de agosto de 2007

O Amor (pensamento a (des)propósito)

O que mais pode ser o amor se não partes de nós entrelaçadas? E às outras partes, as que não se enlaçaram ainda, faça o amor o favor de as convidar...

Musa II

Lembro-me de cada espaço que ocupamos, de cada lugar que construímos. Escuto cada palavra dita, cada nanosegundo de silêncio. Fechaste-me no teu anel, nesse circulo que representa a vida unida. E o anel tinha sido inicialmente uma intenção minha. O presente mais utópico que te desejei oferecer; e julgando-o impossivel, desenhaste-o e construiste-o para que me servisse...
Releio as palavras: as minhas que nascem no teu olhar, e as tuas que me enchem de esperança e de amor. Não ter outro pensamento passou a ser o destino de mim...

Âncora

Onde fica o teu sorriso na minha ausência?
Onde se seguram as tuas mãos?

Tenho-te como uma âncora que me segura num porto
ainda que as marés agitadas me façam baloiçar.

9 de agosto de 2007

Pela manhã...

pela manhã ainda fresca e saborosa
ao meu lado descobri um lugar vazio
onde a cama se deitava direita e zelosa
e ao meio a distância entre as margens de um rio

ao despertar o olhar no limite do céu
o pensamento fugiu para o mesmo lugar
e foi então que no coração aconteceu
a cor vermelha do desejo de amar

Não sinto o corpo

Não sinto o corpo. Ou melhor, sinto-o como um vazio entre espaços, indefinido como o vento entre as árvores estrategicamente colocadas nos passeios. Não lhe reconheço a cor, nem a forma. Não lhe consigo tocar, mesmo que queira.
Pode o amor ser resposta para tudo? Pode o amor servir como desculpa?
A cada instante abdico ainda mais do que me rodeia. São palavras. Ou é silencio? Talvez silencio, a cortar o tempo como facas frias e afiadas. E nem olhar um olhar. E nem um gesto...
Não sinto o corpo. Fazem-me falta o ar e o fogo para que a labareda se anime...

8 de agosto de 2007

O dia seguinte

Cheguei depois da hora marcada. Vi nos seus lábios o sorriso que me faltava. Senti na sua mão quente o calor de que necessitava. Ainda assim os meus pensamentos amargos fugiram de si por longos instantes... Contrariei a vontade. Desafiei até ao limite o desejo de cair nos seu braços para que voltasse a sorrir.
Jantamos entre o tom escuro e ébrio de uma garrafa de vinho e o desabafo triste dos meus pensamentos. Suportei-me no seu sorriso. Agarrei-me à força das suas palavras. E nos seus abraços redescobri a vontade de sorrir. E sorrio, convicto do seu amor...
Obrigado

Sei de cor

sei de cor o gosto de cada beijo
sei de cor o calor de cada abraço
sei de cor a ternura de cada gesto
sei de cor a forma de cada traço

e sei que cada segundo na sua companhia
faz crescer ainda mais o desejo

MIL VISITANTES

Hoje O outro Crepusculo atingiu a fasquia dos 1000 visitantes. Este blogue foi iniciado há 3 semanas e o sucesso do mesmo é repartido por cada um de vós que me brindam com o vosso interesse em relação ao que aqui se escreve.

Espero que continuem a gostar!

Muito Obrigado!

7 de agosto de 2007

Frágil

O teu corpo afasta-se vagarosamente pelo centro da rua
Vejo-te partir sem que olhes para trás. Sem que vaciles.
Torno-me frágil. Frágil e leve como uma folha caída do ramo.
A partir daqui desconheço o rumo que sigo
Seguirei levitado pela aragem na direcção oposta à tua
Com o passar do tempo vou secando a minha imagem

Não me peças os dias

Não me peças os dias
Porque já me consumiste as horas
Os minutos e os segundos
Com o desespero da tua ausência
O meu corpo cedeu ao cansaço
Parou no tempo
Em que as árvores floriam verdes
Não me peças o resto de mim
O que ainda tenho embora breve
Não me peças os dias
Que os tenho um de cada vez
Como se fossem luz e negro
Nos meus olhos

Poema sobre Beja

as paredes caiadas de branco repelem o sol quente da manhã
escuto rumores do destino que esvaziam as ruas cinzentas
à cidade já não regressam os que partem inseguros do amanhã
sem eles os largos são covas gigantes e lamacentas

o que acontece passa ao largo da planicie extensa e triste
e o que não acontece morre no silêncio de cada um que resiste

Good Morning

A noite foi longa... adormeci no sentido longinquo dos meus pensamentos. Do outro lado do mundo onde já se fazia manhã. Desesperei com o lugar escuro da noite que por cá me seguiu nos longos minutos em que os meus olhos contrariavam o corpo cansado. A noite foi longa... tão longa que conheci os primeiros raios de sol. Ouvi os primeiros cantos dos pássaros. Acolhi-me debaixo de uma copa frondosa junto à rua onde nasci. A noite foi longa... e voei nela como uma ave nocturna: desperto.
Good morning, disseste-me de longe quando as nossas sombras se afastaram deixando pelo caminho um mar azul. Good morning, respondi-te com a certeza de que o diriamos pela última vez.
A noite foi longa... A mais longa de todas as noites. Adeus.

6 de agosto de 2007

Somando

aos dias acrescento as noites somando sol e lua
que o meu corpo vagueia no cabo do tempo
entre a minha alma desconcertante e a tua
como se fosse a frente áspera do vento

aos dias acrescento as noites somando fogo e ar
e neles caminho como labareda numa floresta
de denso verde como o segredo do mar
aos dias acrescento as noites subtraindo o que resta

O teu corpo prende-se...

o teu corpo prende-se ao meu
no desespero ardente da paixão
de um amor que se descontrola
no brilho incandescente de cada olhar
e em cada toque em cada pedaço de nós
o mundo agiganta-se infinitamente
entre as minhas mãos e as tuas
aceitando a forma que lhe dermos

Ainda que viva...

Ainda que viva cada instante
amargurado na noite do fim do mundo
Os teus olhos seguem-me para onde quer que vá
como o olhar do falcão antecipando a morte
nas garras crúeis sobre a indefesa presa

5 de agosto de 2007

Podia dizer-te tantas coisas...

Podia dizer-te tantas coisas
No entanto, quando te vejo nada me ocorre.
Treino em voz alta, para os espelhos e paredes
O que vou dizer-te quando te vir,
Nas alturas em que tu não vens e eu te espero.
E quando vens, tudo o que tinha para te dizer,
As frases preparadas e decoradas com tanto afinco,
Que soavam tão bem aos ouvidos dos espelhos e das paredes e dos móveis
Para quem eu as dizia nos dias em que te esperava,
Desaparecem, e na minha cabeça ficam só as imagens
Que entram pelos meus olhos
As palavras que entram pelos meus ouvidos
Os teus sorrisos que entram pela minha alma a dentro
E arrebatam tudo no caminho.
Fico com a sensação de que tinha algo para te dizer,
Mas não passa disso: uma sensação não especificada,
Não objectiva, que sacudo assim que posso.
Porque nos dias em que vens procuro não ter mais nada,
A não ser tu, a perturbar-me.
Quero todo o meu espaço, tudo o que sou enquanto ser receptor
De estimulos e sinais, concentrado em absorver tudo o que me dás.
E então, nos dias em que te espero,
Treino e ensaio, o que sei que vou esquecer nos dias em que vens
E te quero tanto que me esqueço de tudo.

Novel Poetisa, 1 de Agosto de 2007

Queria encontrar...

Queria encontrar uma frase para te dar,
Queria oferecer-te uma série de palavras que seriam só tuas,
Que podias trocar, coleccionar, coloca-las todas numa caderneta de palavras
Que só existiriam para nós.
Prendas que ofereciamos em ocasiões especiais,
Aniversários, festas privadas a dois.
E veriamos essa lista crescer, essa caderneta avolumar-se com palavras, significados
Até criarmos uma nova lingua até termos o nosso próprio dicionário.


Novel Poetisa, 1 de Agosto de 2007

Sem titulo

em cada instante desfaleço
com o sentir da tua ausência.
morro; desapareço.
Desisto do que sou

3 de agosto de 2007

Liberdade

Segue o amor o caminho do meu coração. Por onde passa fica o seu rasto, o seu cheiro acompanha-me nas tardes quentes e as suas mãos seguram-me como âncoras. O lugar perfeito onde me encontro está definido no cintilante brilho do olhar. Sorrio com a sensação do seu toque suave e meigo. Deixo-me ficar aconchegado pelo desejo de a ter nos meus braços uma vez mais. E agora chego à noite com a intenção de saborear os seus lábios. Cerro os olhos e imagino cada beijo... Amando-a sinto-me o mais livre de todos os homens!

2 de agosto de 2007

Tempo





tudo se parece ao passado
o resto é apenas tempo
sem cor e sem forma
como um beijo congelado
que a saudade transforma

tudo o resto é apenas tempo
que se agiganta na memória


Perdi o Sentido das Coisas

Perdi o sentido das coisas,
Da memória nem a lembrança recordo.
Sou um espaço vazio
Que se segura entre muralhas de ar.
Frágil, a vida me condensa
Em duas ou três palavras
Que repito com insistência
Para não me esquecer de mim.
Para não me faltar!

Perdi o sentido das coisas,
Do horizonte nem a utopia me resta.
Sou uma máscara incerta
Que me cobre na íntegra.
Débil, o coração delimita
Os gestos das minhas mãos.
E cada gesto é uma luta, é uma conquista,
Que ergo no meu olhar matinal.

Perdi o sentido das coisas,
Do passado nada ficou.
Longínqua vai a existência trivial
Dos lugares, dos olhares, de tudo
Que outrora me sustentou.

A publicar em "Paradoxal ou Não"
Setembro de 2007

1 de agosto de 2007

Saudades

Tenho saudades. Não porque ainda aqui está. Mas porque a imagino a partir. Porque antecipo os dias nostálgicos que me aguardam. Como um castigo. Tenho saudades.

Porque a Amo

A planície estende-se no limite da vista. No alto da torre de menagem do castelo saboreio uma visita breve de uma brisa que corta o ar quente. Ainda recuperando do fôlego das infinitas e ingremes escadarias que me conduziram ao topo do Alentejo, as minhas mãos amparam-se nas ameias altas. Faltam-me as palavras. É como se me faltasse o ar e não conseguisse respirar. Os meus lábios tenho-os cerrados. Sinto o peito cada vez mais vazio, a asfixiar.
Apesar do calor tórrido desejo o seu corpo ao meu lado. Apetece-me sentir o calor ameno da sua pele suave e doce. Quero os seus lábios frescos para que me enrolem numa onda de mar. De mar imenso como o desejo de a ter.
Daqui, do mais alto cume deste Alentejo dourado e extenso apetece-me gritar: gritar que Amo, e que a Amo, e Amo-a tanto que entre partículas infinitas de ar, de entre todos os biliões e biliões de elementos e de essências que compõem o mundo, apenas a quero; porque a Amo e por isso a Quero.

Quem?

quem do lado de lá me escuta
me vê e estende o braço para me tocar?
quem do lado de lá me fecha num anel
e me deseja tanto que me quer amar?
quem do lado de lá me busca
com a intenção doce de me beijar?
quem do lado de lá se aproxima
para ocupar este poético lugar?

Sem inspiração II

Ainda sem inspiração. Como um lençol branco que me cobre e tapa a luz do dia. Não se contrariam as palavras. Contrariadas as palavras estas chegam amargas e o seu som distorcido.