31 de julho de 2007

Sem inspiração

Sem inspiração. E às palavras não se impõe sentimento. Nem se contrariam.

30 de julho de 2007

Gostava que soubesses...

gostava que soubesses
que o que te resta é a felicidade
peço-te que não te assustes
quando encontrares sorrisos e abraços
que dês os teus lábios aos beijos
e que caminhes serena e segura
gostava que soubesses
que o que te resta é a felicidade
apenas e tão só a felicidade
a que se tem por direito não a que se procura

Sobre Mariana Alcoforado

Sou um admirador da história e das cartas de Soror Mariana Alcoforado. Contudo não sou um especialista ou mais esclarecido do que no propósito de as sentir como leitor. Apesar de muitas teorias e interpretações que as cartas e a sua origem suscitem hoje como no passado, importa-me apenas o seu conteúdo e os contextos temporal e social que as valorizam.

Para mim, Soror Mariana Alcoforado desnudou a sua alma e o seu coração; por amor e pelo prazer de amar permitiu que as palavras seguissem o sentido do seu destinatário. Exposta pelo sentimento nobre do amor, resignou-se ao sofrimento e conviveu com ele na inquietude em que transformou a sua vida. O prazer, o de amar quem uma freira não deveria amar, não a impediu de deixar crescer o sentimento reproduzindo-o no papel de carta com excepcional pureza.

Ousei, e repito ousei, tentar seguir o trilho das suas palavras e ficcionando os seus sentimentos – que de outra maneira não o poderia fazer com honestidade – escrever em forma de poema (?) sobre frases que seleccionei de cada uma das cartas (tradução de Eugénio de Andrade, in Cartas Portuguesas, da Assírio e Alvim. 1998).

Perdoem o abuso!

Jorge Barnabé

“Adeus. Ama-me sempre, e faz-me sofrer mais ainda.”
Primeira carta

Em sobressalto desconheço-me
Tanto te quero que ao medo de te perder
Prefiro a dor violenta de não te ter
Entre mil palavras do teu silêncio
Escolho um adeus que me convença
Das promessas que entretanto arruinaste
Digo adeus querendo dizer que te desejo
Ou se quiseres infligir dor
Prefiro-a a aceitar que não existe amor.


“… E passo o tempo a olhar o teu retrato, que amo mil vezes mais que à minha vida.”
Segunda carta

Em meu redor tudo lembra a tua presença
Tudo explica o palpitar do meu coração
Repito o teu nome no silêncio forçado nos claustros
Para que as paredes altas te reconheçam
E se desmoronem quando decidires o regresso
E à brancura triste da minha cela
Apresento o teu retrato que colori com o amarelo dos girassóis
E o vermelho vivo das papoilas acordadas na planície
Enquanto te amo com o desvario de um amor maior que a própria vida.


“Não sei o que sou, nem o que faço, nem o que quero; estou despedaçada por mil sentimentos contrários. Pode imaginar-se estado mais deplorável?”
Terceira carta

Amedronta-me ver o meu rosto no espelho de água
Que enche o chão irregular dos claustros
Nem sei se sou essa figura miserável que o amor venceu
Ou se aquilo em que me transformei é sombra da mágoa
Os meus trejeitos são apertados e incertos como o coração
Que me recruta entre estes muros que me separam do céu
Tanto desejo como temo amar-te com loucura
E cair nos teus braços para sempre ou fugir de ti
Simplesmente fugir esquecendo que não sei o que sou sem ti


“Bem sei que te amo perdidamente; no entanto, não lamento a violência do meu coração; habituei-me à sua tirania, e já não poderia viver sem este prazer que vou descobrindo: amar-te entre tanta mágoa.”
Quarta carta

Se o meu coração deseja comandar-me a vida
O meu corpo rende-se à sua prepotência
Proponho-lhe apenas que guarde o prazer de ti
De te amar consumida pela dor de não te ter
Que ainda assim me afiança não te esquecer
E à sua fogosidade me resigno
O que pode parecer desgosto não o é
Tão só amor que vivo na falta de ti

“De si nada mais quero. Sou uma doida, passo o tempo a dizer a mesma coisa. É preciso deixá-lo e não pensar mais em si. Creio mesmo que não voltarei a escrever-lhe. Que obrigação tenho eu de lhe dar conta dos meus sentimentos?”
Quinta carta

Despeço-me com derradeiras palavras que me incendeiam o coração
Este que sofreu a suplicia da sua ignorância
Que se definhou na loucura da ausência
E na ferida do silêncio a que me destinou
Busco a serenidade no meu olhar para que possa esquecer de vez
A infidelidade das suas promessas que julguei puras
Como o ar macio que me toca na manhã de primavera
Despeço-me sim digo-lhe adeus por fim
Que já não sinto dever de lhe dar o meu amor

29 de julho de 2007

Depois

Depois do amor dois corpos caiem sobre a cama velha sem ruído, frios como o prazer que já não têm, imóveis como as paredes que os cercam sem suspirar. Depois do amor dois corpos vestem-se com as vestes do adeus, num até sempre que não desejam. Num regresso que não querem repetir. Depois do amor dois corpos já não fazem sentido serem um só...

Basta o Amor

Nem as horas são suficientes para que me aborreças. Basta-me o teu amor. E se te amo, e tu me amas, então querer é tão só um desejo consequente. E os teus olhos não gastarão os meus; e o teu sorriso não colidirá com o meu; e nem as palavras ausentes farão suficiente silêncio para que esqueça que me amas! Entre nós o silêncio construímo-lo à medida que o nosso amor crescer, para que seja, não mágoa, mas outra forma de querer...

28 de julho de 2007

Na forma do amor

E a terra parece que nos engole
em cada instante de desejo
e a lua parece que nos escolhe
na frescura de cada beijo
e as árvores agitam-se frondosas
iludindo os nossos sentidos
e as estrelas passeiam caprichosas
pelos nossos corpos perdidos
e o mar tão longe nos aguarda
repousando no areal deserto
à noite quando a maresia nos afaga
na intenção pura de cada afecto
e o nosso sentimento cresce
como semente se torna flor
que o céu à terra desce
quando nos definirmos na forma do amor

27 de julho de 2007

Finalmente

Finalmente um novo dia... Por fim o Amor!
E os meus olhos brilham de novo. E o meu rosto sorri naturalmente.

26 de julho de 2007

Castelo de Beja

Publico a primeira foto em O Outro Crepúsculo. Retirada da galeria de João Sardica, onde para além desta se podem admirar muitas outras de notável qualidade, escolhi uma perspectiva impar sobre o Castelo de Beja.


Para quem não sabe a torre de menagem do castelo tem uma ligação especial para os bejenses, servindo como azimute. A sua imponência destaca-se nos campos planos que circundam a cidade e é visível desde muito longe.


Ao João Sardica agradeço a autorização para a sua publicação e exorto-o a continuar a deliciar-nos com estas imagens. Um dia, meu caro, aliaremos a poesia às fotografias...

Estás aqui

estás aqui:
no lugar mais perfeito, onde tudo tem sentido, onde tudo faz sentido.

Sono profundo

Não dei pela manhã. Passou por mim enquanto dormia num quarto escuro e frio. Sonhei com as futilidades noctivagas das conversas. Deixei o meu corpo imóvel sobre a cama larga e cobri-o com o silêncio. Não ouvi os pássaros ao nascer do dia. Não senti a luz solar a entrar nas frestas dos estores. Um sono profundo tirou-me o prazer da manhã azul e limpa.

Entre amigos

sossega-me que os dias não são fáceis.
faz-me rir
sem que tenhas de dizer seja o que for.
deixa-te estar aí onde sempre estiveste,
discretamente.
e quando menos esperar aparece,
para pura felicidade da minha dor.
traz-me um sorriso para secar esta lágrima,
zanga-te comigo se for preciso.
mas deixa-te estar.
fala-me ao ouvido.
sussurra-me os dias que virão,
encontra-me se estiver perdido.
leva-me ao colo.... levanta-me do chão.

LUGAR ETÉREO. 2006

25 de julho de 2007

Lugar Etéreo: edição online

Em Fevereiro de 2006 publiquei o meu primeiro livro de poesia. Digo primeiro com espanto porque não me atrevia a pensar num segundo - a publicar em Setembro - ou num terceiro já em fase de preparação. Dei-lhe o nome de LUGAR ETÉREO, porque o conceito se aplica ao sentimento que então vivia e que procurei expressar nos poemas que escrevi.
Do LUGAR ETÉREO fica agora o distânciamento que o tempo me impôs e a vontade de dar seguimento a sentimentos que me ocupam a vida.
A edição de 750 exemplares já esgotada poderia subentender uma nova reedição, o que decidi não fazer. As coisas têm o seu tempo e um contexto próprio que nos expõe enquanto autores e confesso que a sua reedição não acompanha os meus sentimentos actuais.
Assim, e respondendo às solicitações para aquisição do livro decidi editá-lo neste blogue, o que espero esteja concluído em breve. Agradeço imenso o estímulo que me têm transmitido para que continue a escrever e que pretendo retribuir com um sentimento forte e puro que procuro clarificar nas palavras.

24 de julho de 2007

O seu cheiro

Sinto o cheiro do seu corpo a passear na rua que percorro como se fosse a brisa nocturna que me toca a face fresca. Caminho pelas ruas desertas de uma cidade que se esvaziou na época estival, e passo a passo sinto que me acompanha. As luzes amarelas dos candeeiros acendem-se e apagam-se junto à marginal que contorna a cidade. Escuto a tranquilidade dos campos de girassol que adormecem sob o céu estrelado. Ainda sinto o seu cheiro a passear ao meu lado. Sei que não estou só. Agrada-me sentir a sua companhia. Em meu redor tudo se parece com a sua figura. Convenço-me que a vida é romântica. Acredito a cada passo que caminho que o meu amor por si é cada vez mais forte.

A pianista

Sentada ao piano tocava uma melodia que entoava o salão com a serenidade de uma pauta que desconhecia. As suas mãos voavam eloquentes como gaivotas sobre o mar. Tinha o cabelo castanho claro e usava um vestido branco que lhe vestia o corpo, a defini-la com sensualidade.

Era o único cliente no bar do hotel aquela hora e cheguei a pensar que continuava a tocar com a obrigação de satisfazer o gin que tinha sobre a mesa. Reparei que o barman arrumava o balcão e me olhava com um misto de cortesia e de vontade para que me fosse embora. Passava da meia-noite e naquele hotel em Bruxelas engolia a saudade em sucessivos copos de gin tónico. Chamei o barman e pedi-lhe a conta e uma última bebida para que percebesse que sairia em breve.

A pianista continuava a tocar como se o salão do bar estivesse cheio. Observou a minha conversa com o barman, a quem pedi que lhe servisse uma bebida. Serviu-me sem que desse por isso, desejando-me boa noite.

Peguei no telemóvel e escrevi coisas absurdas e sem nexo. Coisas que crescem na distância e que se alimentam com a agrura da nostalgia. O meu olhar estava fundo e triste. Descaído como a copa das árvores que morrem lentamente.

Recostei-me no cadeirão de veludo vermelho, acendi um cigarro que fumei de olhos fechados e assim fiquei por uns instantes absorvido pelas notas melódicas do piano. Dei os últimos goles no gin, apressados e decididos, sorvi um pedaço de gelo e levantei-me devagar. Ao mesmo tempo a música parou.

Já de pé agradeci a paciência do barman e sorri cúmplice à pianista. Sorriu-me com ternura. Levantou-se e caminhou na minha direcção com a elegância de uma diva. Em francês agradeceu-me a bebida. A conversa não se poderia prolongar pela dificuldade em lhe responder. Tentei falar-lhe em inglês, felicitando-a pela sua actuação. Respondeu-me com um sotaque germânico acentuado mas bem mais perceptível que o francês.

Notei que reparara no meu ar abatido pelas balas da angústia e num gesto inesperado convidou-me para sentar junto ao balcão. Chamou o barman pelo nome e com os dois dedos da mão esquerda no ar pediu duas bebidas. Ofereci-lhe um cigarro ao mesmo tempo que lhe explicava que tinha de ir descansar. No dia seguinte regressava a Portugal. Percebi a sua sensualidade na forma como me sorria e olhava e na maneira como ajeitava o seu corpo no cadeirão e se debruçava insinuante para recolher o copo de vinho branco na mesa baixa.

Disse-me o seu nome: Astrid, da Áustria. E estava em Bruxelas a tentar a sua sorte como música. Estava ali como poderia estar noutro lugar, disse-me. Expliquei-lhe o que estava a fazer em Bruxelas naquela semana. Continuava a insinuar-se cada vez mais descaradamente. Conversamos enquanto fazia questão de lhe desviar o olhar. Perguntou-me porque estavam os meus olhos tristes. Respondi-lhe que por amor. Riu-se. Riu-se, incomodando-me com a sua reacção. Repeti-lhe, preocupado que não tivesse entendido: “Por Amor, porque sinto saudades de quem amo. Porque hoje desejei que essa mulher tivesse passeado comigo pela Grand Place. Porque os dias sem o seu cheiro são apáticos e insonsos.”.

Propôs um brinde que não recusei e quando pousamos os copos sobre a mesa agarrou-me a mão entrelaçando os seus dedos nos meus. Tinha as mãos finas e suaves como a seda e fez questão que as sentisse apertando as minhas com delicadeza, deixando-me sem resistência.

O barman estava ainda mais impaciente e Astrid convidou-me para irmos beber uma bebida num bar que conhecia e estaria aberto aquela hora. Agradeci o convite e tentei recusá-lo com a desculpa do cansaço e dos meus compromissos na manhã seguinte. Insistiu olhando-me nos olhos e sorrindo amorosamente. Percebi no seu convite e nas suas expressões as intenções implícitas. Ainda assim acedi, com a promessa de que não demoraríamos.

Saímos do hotel a pé. A noite estava fria e a chuva caía sobre a rua e os nossos corpos agasalhados. Sugeri que fossemos num táxi que estava parado à porta do hotel, colocou o seu braço em redor do meu pedindo-me que caminhássemos.

Pouco passava da 1 hora da madrugada, era quinta-feira, e aquela hora em Bruxelas as ruas do centro pareciam abandonadas. Lembro-me do silêncio que rasgamos com uma conversa desapropriada. Atravessamos a Grand Place e seguimos por uma rua mais estreita onde nos rimos com a estátua do Make-a-Pice. Uns metros mais adiante entramos num bar com decoração clássica, as paredes forradas pela metade a madeira escura e uns sofás alinhados em redor. Sentou-se primeiro no sofá em frente ao meu e uns instantes depois no sofá grande ao meu lado onde me acariciou o cabelo delicadamente.

Conversamos entre bebidas que caíam na mesa como relâmpagos e a curiosidade vulgar de comparar países diferentes. Quando demos conta éramos os únicos clientes no bar. Saímos abraçados um ao outro desafiando a lei da gravidade…

Lembras-te?

lembras-te?
da noite junto ao mar
quando enrolamos os corpos suados de paixão?

lembras-te?
quando entramos naquela casa despida
e nos despimos de paredes falsas?

lembras-te?
daquele mergulho salgado
que nos transformou em flor-de-sal?

lembras-te?
do teu coração a saltitar no brilho dos teus olhos
quando dizias que me amavas?

lembras-te?
eu lembro-me de tudo...

LUGAR ETÉREO. 2006

23 de julho de 2007

Os reencontros

A memória traz-me ao olhar a imagem clara de pessoas que não vejo há muito tempo. Por culpa do tempo, das vidas que se descruzam. Lamento a ausência. A minha, claro. Mas a memória traz-me lembranças boas e frescas das horas em boa companhia. Dos gestos de amizade que reconheço com eterna gratidão. Que fique claro que um dia serei capaz de pôr em ordem os reencontros. Para que possa sorrir em pleno.

contigo as noites

escuto a tua respiração na outra ponta do sofá
suspiramos em uníssono na tranquilidade de uma noite a dois
convidamos o silêncio para nos acompanhar num instante de amor
contigo as noites são como poemas
profundos e frescos intensos e extasiantes
escolhi um livro para desviar o olhar
do teu vestido branco e curto como o luar
olho-te no limite da minha visão
para que não saibas que te contemplo

contigo as noites são como poemas
que me enchem a alma de imensa paixão

Doce como a fruta...

Doce como a fruta que como
Meigo como os gatos que se roçam nas minhas pernas
Quente como o café que bebo
Calmo como as águas
Dormia com a calma da manhã
Enquanto os pássaros cantavam lá fora
O sol brilhava muito, incandescente
Acorda com o toque irritante do aparelho que descansa ao lado da almofada
A vontade não é muita, mas a varanda espera
Um copo de água para acalmar a secura matinal
Um cigarro para despertar
Sorri ao sol que incomoda de tão brilhante

Novel Poetisa
22 de Julho de 2007

Cinzento

O dia veio cinzento e chuvoso. A água cai sobre os corpos acostumados ao calor do verão. As ruas cheiram a terra molhada e as árvores agitam-se escorraçando a água que as limpou. Não sei do sol. Esconde-se acima da neblina.
Hoje a cidade parece diferente, ainda mais apática do que nos outros dias. Os rostos passeiam tristes os corpos pelas ruas. Em redor da cidade os campos encolhem-se no dourado raso do restolho. Abandonados na solidão do tempo. Talvez no litoral tudo esteja diferente. Talvez as pessoas tenham trocado o campo pela praia na esperança de encontrar o sol...
Os dias custam a passar. A melancolia ocupa-nos o espírito.

Antologia Poética Pessoal

A poesia vive dentro dos sentidos que cultivo. Dos que são puros. Dos que são sérios. Dos que são sublimes. Brevemente divulgarei a Antologia Poética Pessoal, para que partilhe convosco, não apenas o que escrevo mas o que os poetas maiores escrevem.
Espero que apreciem.

Reinvenção do amor

inventei-te. inventaste-me.
reinventamo-nos na madrugada dos afectos.

partilho contigo as horas de silêncio
em que nos escutamos sobre a água que escorre na rua.

levo-te. levas-me.
levamo-nos um ao outro.

damos as mãos. enlaçadas.
apertadas. na reinvenção do amor.

22 de julho de 2007

Por aqui!

Por aqui passeiam rosas e orquídeas como se o nosso amor fosse um jardim. Por aqui se refresca a tarde nos oásis do deserto. Entre os braços que abraçam com paixão e os lábios que beijam loucamente. Dizer tudo é insuficiente. Falar sobre o que se passa por aqui é demasiado redutor da nossa existência.
Sim! Escutemos o silêncio profundo dos nossos corações...

21 de julho de 2007

Sobre a Foz

do outro lado as casas alinham-se brancas
em direcção ao mar acompanham o rio
onde desejo o teu corpo esguio
chamam de foz às entranhas estreitas
onde o mar entra feroz
quero-te nas ondas bravas e espumosas

Entre o sonho e a realidade

Entro no mar frio e verde. Mergulho com a intenção de tocar a linha do horizonte que me desafia ao longe. O meu corpo adapta-se nadando até à exaustão. Cresço em cada onda como se fosse emergir gigante. Paro por uns instantes. Olho para trás onde uma linha branca se afasta. Foi dali que parti. Do areal branco e quase deserto. Uma figura prende-me a atenção. Puxa-me como um ímane. Estou entre o desejo de regressar e a utopia de conquistar o horizonte. Entre uma realidade que desconheço e o sonho que alimenta os Homens. Regresso, sentindo o conforto da figura distante. Regresso embalado até à costa pelo sentido das ondas. Regresso. E à medida que me aproximo revela-se a forma contornada de uma Mulher. O seu rosto sorri-me com os olhos.
Acolhe-me à beira-mar. Abraçamo-nos. Beijamo-nos.
Rendo-me ao Amor de uma vida...

20 de julho de 2007

ESTRANHA FORMA DE VIDA


Um dos maiores prazeres que tenho são os livros. Não será verdade dizer que os consumo alucinadamente. Sou selectivo de acordo com os meus gostos e interesses. O prazer é redobrado quando alguém oferece um livro. No caso foi-me ofertado há uns dias o terceiro romance de Carlos Ademar, um género policial, intitulado Estranha Forma de Vida, editado pela Oficina do Livro.


Confesso-vos o prazer das primeiras páginas que li e que decidi continuar esta leitura na tranquilidade das férias que se aproximam. Muito me custaria aconselhar um livro por simpatia. Não o faço com tal desencanto. Aconselho que o leiam pelo prazer de ler um escritor que apesar da experiência nos faz viajar num mundo que desconhecemos ou ignoramos.


No regresso das férias voltarei com toda a certeza ao tema. É merecido.


De Carlos Ademar existem outros dois romances, ambos publicados pela Oficina do Livro:

O Caso da Rua Direita (2005) e O Homem da Carbonária (2006).


Para Carlos Ademar fica o agradecimento pela obra que nos oferece e a expectativa de uma apresentação em Beja, em breve.

Lugar incerto

Fecho a tarde num aperto que me ata o coração. Temo a noite que se segue, incerta e dolorosa. Quero acreditar no regresso, nas oportunidades que gasto como folhas de rascunho. Sinto o peso da mágoa nos seus olhos. Percebo que os lugares se esgotam nas sombras negras das palavras.

De nada servirão os meus olhos agora límpidos e desimpedidos. De nada servirá um sorriso puro e sincero. Repito na minha cabeça a letra do cantor: "é muito mais o que nos une que aquilo que nos separa". E repito-o para que ganhe coragem de convence-la.

De que servem os lugares se não os sei ocupar?

E amo-te

quero os teus olhos desesperadamente
e os teus lábios doces a beijarem-me apaixonadamente
quero as tuas mãos nas minhas como ancoras
onde me funda no abrigo dos teus abraços
quero-te tanto como te amo
quero-te hoje amanhã e sempre

e amo-te

Lisboa - Beja?

Fui a Lisboa. Percebi uma vez mais que fiz bem em voltar a Beja. Apesar de tudo. Tenho a convicção de que o que sinto é forte e inabalável. E aqui estou em sossego. Em paz. Amparado. Mas ainda gosto da luz no céu sobre Lisboa, da cidade que nos faz ser anónimos nas ruas e nos cafés. Para trás ficou o passado. As coisas que não se repetem e que são por isso mesmo especiais.

Mas agora sei que fiz bem em regressar. É aqui que farei o caminho. Aqui me apararei no olhar terno de quem me sossega. Na capital fica um edificio alto de silêncio. Um Lugar Etéreo, de que não abdico. Aqui , junto aos campos abertos e infinitos, lanço os meus braços ao amor. Se o Amor me quiser.

Paradoxal ou não

Em Setembro será apresentado em Beja um livro de poesia conjunta entre o autor deste blog e António Revez. Dá pelo nome de Paradoxal ou não e junta duas perspectivas e formas diferentes de abordar o amor, o desamor, a alegria e o sofrimento deflagrado deste sentimento. Em altura oportuna divulgarei a data, o local e a hora da apresentação.


Doendo

tenho agora a noção perfeita e dolorosa do que sinto
do que sentes pela amargura das minhas palavras
passam as horas como se fossem facas a trespassar o meu corpo
as facas que te apontei viraram-se contra mim
apontadas afiadas com o teu silêncio

estou nesta dor como na vida vazia sem ti
o meu corpo contrai-se na ausência do teu

19 de julho de 2007

Sem titulo

Hoje quero as palavras. Preciso delas para me vestir na tua ausência. Para que me cubram a mágoa da despedida. Quero as palavras que me animam. Palavras que me façam sorrir de esperança. Hoje quero as palavras. Quero-as e desejo-as como se fossem ar, como se fossem água para matar a sede. Hoje quero as palavras amargas que me façam sofrer por ti. Bastariam poemas tristes, daqueles que falam do adeus e da miséria do desamor. Hoje quero as palavras. Quero me incluir nelas como se fossem uma redoma.

Ando...

Ando pelas ruas tórridas de amargurados corpos suados
Ando calado sem sorrir
Ando vestido pelas mágoas sofridas dos tempos perdidos
Ando só no calor da esperança de um amor que tarda em desaparecer
Ando sempre pela manhã com a tua imagem no meu rosto triste
Ando devagar arrastando as muitas desesperanças
Ando e caminho para longe

António Marques Revez, Aluimentos. 2005

Levanto o olhar...

Levanto o olhar na direcção do teu
Ergo as mãos ao céu para as descair no teu corpo
Com a intenção de te abraçar
Os meus lábios procuram-te
Com a ansiedade do beijo que recusas
O tempo passa
E de seguida percebo que já não te quero minha
Sigamos outros caminhos
Que este já não nos pertence

Da copa alta...

Da copa alta dos plátanos
Vêem-se lugares apátridas
É lá que busco o meu coração
Ou algo que se assemelhe com a sua cor

Encontro

cruzamo-nos quando a noite se fazia madrugada
esperamos pela aurora pelo nascer do dia
aguardamos pacientemente o beijo desejado
junto à cidade os nossos corpos foram sementes
que o barro negro acolheu na manhã dos outros
ouvimos o restolho amanhecer nos nossos olhos
demo-nos ao amor como se fizesse sentido

Fim

Tudo tem fim
Tudo é tão definitivo como a vida
Tudo se esgota
Tudo farta
Tudo acaba

Acabou o amor
Fim

18 de julho de 2007

O tempo do amor

Já não sabe mais o que lhe dizer. Ela foge com o olhar para não o confrontar com a verdade. Talvez apenas o tempo conte. Talvez seja isso que quer, que caminhem lado a lado enquanto houver tempo. Inunda-a de palavras na expectativa de que o escute. Responde-lhe com o silêncio de uma paixão inanimada. É assim que se inicia o fim...

Amanhã, ou depois, num destes dias, nem a sua mão chegará perto dele. Nem o seu cheiro circundará as casas que habitam por enquanto. Nem o seu sorriso será suficiente para o fazer ficar. Não que desista. Não que abdique. Mas porque se cansará de falar sozinho. O que poderá um homem fazer aos sentimentos maiores e puros se os cala no silêncio?

Passeiam os corpos pela casa cada vez mais vazia. Desencontram-se estrategicamente à volta da mesa ou nas pontas do sofá. Já não lêem em conjunto. Já não partilham o interesse de assitir a filmes, aninhados um no outro. A mesa das refeições é usada à vez. A paixão esmorece-se a cada segundo. A porta aberta para que entre uma brisa no final de tarde é um convite para que saía de uma vez por todas.

Já não há tempo. Já não há razão para que se abracem. Os beijos outrora doces são agora amargos sabores da desilusão. Ela caminha noutro sentido. Ele silenciou as palavras.

Ali vivia a esperança do amor. Agora apenas ruínas e cinzas assinalam a passagem de um casal. Até que o vento mude a paisagem fúnebre. Até que o tempo tome conta do lugar. Tal como ela desejara...

O espanto de ainda me quereres...

O espanto de ainda me quereres continua em mim, como uma sombra.
A forma como me recebes no teu castelo...
Como se eu fosse alguém a regressar onde pertence.
Recolhes-me da confusão onde vivo, do caos
e por alguns minutos, horas, tudo parece no seu lugar.
Bem encaixado, como as peças de um puzzle perfeito.
Mas há sempre um pormenor, um detalhe, um espinho, uma espinha que se mete pelo meio.
E és tu que a colocas lá. És tu que provocas o incómodo. És tu que estragas tudo.
Que arruinas o castelo de cartas perfeito...

Novel Poetisa
17 de Julho de 2007

Apartam-se as mãos

Apartam-se as mãos
Fogem com as palavras em sentidos opostos
Para lugares distantes onde não se escutem
Onde não se magoem
Levam a saudade como pretexto para o regresso
E na volta com a intenção de uma nova fuga
Apartam-se um do outro
Porque em companhia não são mais que um crepúsculo

O dia e a noite que se fundem num instante breve

17 de julho de 2007

O Custo da Transparência

É verdade que os resultados eleitorais exigem a admissão de responsabilidades. O que se passou em Lisboa no dia 15 de Julho foi nefasto para os partidos da direita. O PSD teve o seu pior resultado de sempre e muito abaixo de quaisquer previsões. O CDS/PP perdeu o seu único vereador na capital do país.

Se estes factos são inquestionáveis pelos números e pela importância que cada partido tem no equilíbrio do sistema político é igualmente necessário explicar as razões que os conduziram a tamanha derrota:

Em primeiro esclarecer que não sou nem de perto nem de longe partidário das ideologias e orientações da direita. Mantenho-me na esquerda, mas essa explicação ficará para outra oportunidade.

Em segundo explicar que se no caso do CDS/PP a aposta se deveu à necessidade política de Paulo Portas de marcar um espaço que provavelmente o seu partido já não tem e que lhe custará mais que uma reflexão pessoal, no caso do PSD a questão é muito mais complexa.

Não posso em consciência manifestar o desejo de valorização da credibilidade do sistema político e ignorar a atitude de Marques Mendes neste processo e noutros semelhantes. Apesar da sua liderança ser frágil desde o início – e a esta fragilidade não são alheias a habilidade política de Sócrates e a maioria parlamentar do PS – a atitude de Marques Mendes é de coragem. Sobrepor a interesses partidários de manutenção de poder os princípios e os valores morais que garantem a sanidade do sistema democrático é raro e deve ser elevado.

Mas como já nos habituamos é mais fácil gerir a política como algo mercantil e frio. Não sendo do PSD defendo que a atitude de Marques Mendes merece pela seriedade, entretanto demonstrada em casos semelhantes como o de Isaltino Morais, ser agradecida por todos como um exemplo de valor político escasso.

A Marques Mendes custar-lhe-á cara a convicção de que é necessário credibilizar a política. Os interesses não se revêem na transparência. Não se sociabilizam com tais práticas.

Já Paulo Portas poderá ter percebido que foi extemporâneo o seu regresso. Ou que o seu pseudo-estatuto de líder da direita portuguesa afinal não era tão verdadeiro quanto julgaria. Imagino o que lhe passa pela cabeça. Mas não lamento o que lhe possa acontecer politicamente. O seu exercício político ficou marcado pela demagogia, pelo populismo e pela incoerência. Que mais pode esperar Portas senão que o vazio se ocupe do espaço que quis ocupar.

De aqui em diante muito acontecerá e se alterará na direita política em Portugal. E permitam-me o desabafo: perderemos todos com esta instabilidade. O país precisa de estar estável e a estabilidade não se mede numa maioria que suporte o governo, é necessário que a oposição também viva tranquila para fomentar a crítica e consolidar políticas estruturais de que carecemos.

Novel Poetisa

Do outro lado da rua passeia uma jovem poetisa. Tento acompanhar-lhe a passada. Observo os seus olhos verdes e grandes que admiram o mundo em pormenor. Que descrevem flores e pássaros, mágoas e amores. O seu caminho fá-lo na dúvida dos seus passos, com a timidez própria de quem se segura nas palavras e delas fizesse uma âncora.

Aceno-lhe com a intenção de a convidar para este lado da rua onde o passeio embora mais estreito é regular. Daqui podemos ver os outros e deixamos que os outros nos vejam sem que nos incomodem os seus olhares.

A tarde chega ao fim. No início da noite brinda-me com um sorriso em forma de poema. Suspiro fundo com cada estrofe. Sigo as imagens que me deixa gravadas na memória fresca como se fossem um mapa que descrevera por palavras. Reconheço os caminhos e os gestos, identifico as palavras e as cores. Inalo os cheiros das metáforas e quando dou por mim sinto que já não respiro. E ainda assim vivo, porque me alimenta na pureza da sua poesia.

Do outro lado da rua passeava uma poetisa. Hoje senti-a a meu lado. Maior que tudo o que poderia desejar conhecer.

E Depois

E depois,
Apenas as palavras fazem sentido;
Os gestos foram demasiado ténues
Para se salvarem.
Esqueci-os. Tal como esqueci o vento
Que me acariciou na madrugada.

Fiquemo-nos pelas palavras
Que falaram de amor nas horas da ausência.

16 de julho de 2007

Amor provável

A manhã amanhecia lenta. Acordaram separados pela largura da cama. Aproximaram-se tocando primeiro as mãos e depois os lábios. Não trocaram uma única palavra. Acariciavam-se apaixonadamente enquanto o calor invadia a casa. Lá fora os pássaros já viviam o dia desde a aurora. As árvores estavam imóveis aguardando uma brisa que as animasse. Ainda restava uma vela acesa da noite passada. Era a única luz que revelava os seus corpos agitados de prazer.

Era domingo. Tinham todo o vagar do mundo. Apenas o desejo poderia ter sido o limite. Ela olhou-o nos olhos, fixamente, sobre o seu corpo deitado na cama desarrumada. O seu olhar era como o sol, brilhante e quente. O seu sorriso de prazer fê-lo sorrir. Percorreu o seu corpo feminino com as mãos lentamente até a apertar num abraço. Ficaram assim por um momento. Como se fossem um. Sem uma única palavra. Beijaram-se novamente até que os seus corpos se separaram na imensidão da cama larga. Acenderam um cigarro deixando que o fumo cobrisse as suas figuras.

Ele olhou-a. Olhou-a com a força interior do seu corpo, da matéria e da essência, esticou o braço na sua direcção, como se construísse uma ponte sobre o mar, acariciou-lhe a face suave e esbelta.

Amas-me? Perguntou-lhe receoso de uma resposta negativa.
Provavelmente… Respondeu-lhe, sorrindo com a incerteza do sentimento.

Mensagem Não Recebida

No rescaldo de mais umas eleições, apesar de que sendo intercalares as considerem desculpáveis na análise e nos resultados, fica uma vez mais por abordar a questão de fundo – a do fundo onde chegou o sistema político português, a abstenção. Como disse Salgueiro Maia, há vários tipos de Estado e há também o Estado a que isto chegou!

Na última década as diferentes eleições têm sido marcadas pela abstenção elevada. Este fenómeno que condiciona os ciclos do poder é numa análise mais profunda uma grave doença do sistema. Da qual poderá resultar um desfecho fatal.

Abordar o fenómeno da abstenção justificando-o com desculpas fáceis e ligeiras como a praia, o sol, a chuva, o vento, entre outros, e fugir à questão principal que é o desinteresse dos eleitores devido à descredibilização do sistema político, das políticas, dos partidos e dos agentes políticos, é bem mais grave que meter a cabeça na areia. Trata-se de branquear uma verdade quase absoluta. E digo quase absoluta porque partimos do princípio filosófico de que não há verdades absolutas.

A classe política vive após três décadas da revolução democrática a fase mais negra da sua existência. Se pararmos para pensar trinta e quatro anos é muito pouco tempo para que aqui se tenha chegado.

Há razões para entender tal descrédito: os baixos salários dos agentes políticos, o que condiciona a entrada no sistema dos mais capazes e competentes; a incapacidade de gerar ideias e projectos, o que nos aborrece com as discussões balofas e infinitas; a recorrente demagogia e incoerência dos políticos, o que nos faz acomodar à previsibilidade das suas reacções; e por último, mas não menos importante, a ausência de renovação dos partidos e dos agentes políticos, o que nos daria garantias de novas políticas geradoras de progresso e de restabelecimento da confiança na relação inquinada entre sistema político e eleitores.

A abstenção resume-se à falta de confiança e daqui parte para o desinteresse dos cidadãos. Mas talvez seja mais prático justificar o que se passa recorrentemente com o clima ou a tendência ociosa dos portugueses. E a quem servirá tais argumentos? Aos políticos em primeiro lugar que assim se acomodam nos lugares tal como têm feito nos últimos trinta anos. Aos comentadores em segundo, que assim justificam as suas análises fúteis e descontextualizadas da realidade.

Os políticos guiam-se pelas opiniões dos comentadores (com excepções) e estes gostam de saber que as suas opiniões são decisivas. No meio, num espaço cada vez mais lasso, está um povo que desde o mundo rural ao meio urbano tem dificuldade em entender os porquês – quando lhes são justificados – e de aceitar a palavra de um político como um compromisso sério.

Neste país habituamo-nos à discussão do acessório em detrimento do essencial. É um método, tal como outros, benéfico para alguns mas muito mau para o futuro de um país que se quer democrático e participativo.

Há dois anos garantiram-me que com este governo o país mudaria! Tive as maiores reservas e ainda as mantenho, e quanto mais o tempo passa mais me convenço do que as suporta. O país está a mudar, mas será que é este caminho que queremos caminhar?

Provocam-nos as liberdades e das que ainda nos restam fica a liberdade de não votar. A isto chama-se abstenção.

Fique o povo a saber: a mensagem não chegou ao destinatário!

Histoire d'un amour

Voici l'histoire d'un amour:


Un amour de cent ans, expression des forces profondes, dans le secret des coeurs comme dans le propos de ce livre. De toucher a toute. Un homme est une femme ce ame à la folie. Passionnément...

15 de julho de 2007

Naufrago

Sabes-me naufrago solitário
Conheces-me desde as manhãs
Que amanhecia à beira mar
E apenas as minhas pegadas calcavam o areal
Sabes-me naufrago
Sem barco e sem terra firme
Sabes-me como sou
Quem sou
E ainda assim me deixas naufragar

O Regresso

Regressei ao passado, aos dias de estátuas poeirentas
Esculpidas pelo seu silêncio e imaginadas pelo rosto da nostalgia
De nada valeu contrariar o destino
Agora as horas são mais vazias mais vagarosas
Tudo o resto é igual. As árvores crescem para o céu
E as flores pintam as planícies e os vales até ao rio
Onde as pedras se mantém imóveis aguardando o seu regresso.

Noite Branca

A noite chegou de branco e silenciosa. As árvores agitavam-se com o vento frio que iludira o dia abrasador de verão. As nuvens tocavam os telhados rasos das casas na parte baixa da cidade como se fossem um lençol de seda a esvoaçar sobre os sonhos.
Sentiu-se a sua ausência. Como se fosse a mágoa que uma luz branca trazia na cor da noite. A nostalgia é um sentimento vazio, feito no ruído ensurdecedor do silêncio. "fazes falta!" - gritei entre as casas abandonadas. "Fazes falta!" - repeti, gritando pelas ruas que percorria até encontrar o lago no centro da cidade. Aquele onde me ensinara o valor da água, e me explicara o porquê do verde na copa das árvores. O lago é raso. Já não tem fundo para se desejar o futuro. O lago está raso e o verde na copa das árvores é pálido. "Fazes falta!" - repeti pela última vez suspirando de cansaço sobre as pedras cinzentas da nostalgia...
A noite chegou de branco e silenciosa. Quis rasgar o silêncio e gritar o seu nome. Desejei que a névoa densa e esvoaçante me enlaçasse para lhe tocar uma última vez. Para lhe dizer simplesmente: "Fazes falta! Ainda fazes falta!...".
O tempo corre lento nos dias que me esforço para sobreviver. Já não tenho as suas mãos para me segurar pelos ombros... Agora sou a reinvenção do destino. Do meu próprio destino.
A noite veio de branco. Quero ver neste branco o branco da paz. A cor da tranquilidade. O branco de uma luz que me guie na temerosa dor da ausência.
A noite chegou de branco e silenciosa. Elevemos a voz para que se escute o sentido da paz.

13 de julho de 2007

Musa

Os dias passam sem que dê conta do tempo. Agora tudo parece mais leve. Não existe amargura. Não há espaço para a desesperança. Encontro no reflexo de um olhar brilhante um lugar para permanecer em sossego. Aqui existe um Lugar Perfeito. Onde o sorriso contagia o crepúsculo. É fácil desejar. É fácil querer seguir em frente.

Vôo como uma ave. Livre. Na liberdade dos afectos que me preenchem os lugares antes vazios de esperança. Vôo como uma ave. Guio-me pelo centro da terra.

Nasceu uma nova Musa. E para ela segue o sentido mais puro das palavras...

12 de julho de 2007

Adeus

Olho para trás
E apenas vejo a neblina densa da memória.
Apenas oiço o som distorcido
Das palavras gastas.
Foste tanto na minha vida
Mas já nem és água nos meus olhos,
Apenas o definitivo adeus
Que te encerra em precoces poemas meus.
Houve tempos em que eras o meu pensamento,
Em que as aves voavam ao teu encontro.
E sempre que uma flor floria
Eu acreditava ser o teu sorriso.
Em certas alturas cuidei dos teus olhos
Como se fossem meus,
E através deles visse o teu mundo.
Mas agora já não importa se sorris
Ou se os teus olhos são reflexos
Que se vestem de negro.
Não importa se as ruas cerram a escuridão,
Ou se o teu corpo treme de medo.

Agora olho em frente e já não te vejo!
Adeus!

Solidão

Continuas tão distante
Que o silêncio é o único diálogo entre nós.
Nem um olhar de esperança,
Nem um gesto por ténue que seja,
Tão só esta linha infinita
Que desenhamos quase transparente
Para que mal se veja.
Já não ouso chamar-te Amor
Prefiro tratar-te por silêncio
Porque assim sei que me respondes
E que posso escutar-te na solidão.

Diálogo dos Silêncios

Deixa o teu amor aqui
Fecha-o no diálogo dos silêncios
Nos armários obscuros da tua casa
Prende-o às ombreiras das portas
Agarra-o no parapeito do varandim
Deixa o teu amor aqui
Como uma ave adormecida na sua asa
Ou uma flor moribunda no jardim
Não fales com o teu amor
Diz-lhe que gostas do silêncio
Dos momentos de sossego
Das palavras sem fervor
Deixa o teu amor aqui
Nas conversas mudas
Que calas com receio
Dos desejos que afundas
Sem coragem de enfrentar
Deixa o teu amor aqui
Não o leves para outro lugar
Fecha-o no diálogo dos silêncios.