29 de novembro de 2007

Até Outro Lugar

Hoje encerro o lugar das palavras. Tudo tem um espaço. Tudo tem um tempo. E nada faz sentido sem um olhar cúmplice. Para os que apreciam as palavras e se reveem nos sentimentos a gratidão, que nem as palavras mais calorosas definem.

Numa vida há muitas vidas e na vida das palavras nos reencontraremos.

Jorge Barnabé

27 de novembro de 2007

Poema do Compromisso

Acabe tudo. Transforme-se tudo. Alterem-se os rumos.
Redefinam-se os sentidos. Tudo pode ser diferente.
Tudo seria diferente. Uma palavra acompanhada de um gesto.
Um pedido determinado na convicção.
Tudo seria diferente se as palavras tivessem outro tom,
se as frases se estendessem noutras formas que não a do papel branco.
Se os ouvidos que nos escutam nos escutassem... com atenção.
Tudo. E querer tranformar tudo não é coragem!
Não é sequer ousadia! É medo... Sim medo!
É um sentimento que nasce no terror de perder o que tanto se deseja.
É um estremecer acentuado a percorrer o âmago.
É uma alma que vacila receosa.
Pode acabar tudo. Podem-se alterar os rumos.
Pode tudo ser diferente que eu resisto sempre que existires!...

21 de novembro de 2007

Por fim o fim

Encalho no tempo de uma vida entre outras vidas.
Gasto o olhar. Abuso das ideias e do pensamento.
Esvazio-me como um copo que depois se vira sobre o tampo da mesa.
Restam umas gotas que escorrem formando pequenos lagos na madeira negra.
Encalho no tempo. Dou por mim no fim das utopias.
Reconheço o cheiro da amargura.
Abdicar é uma opção. Uma opção é escolher.
Encalhado no tempo de uma vida dou espaço ao que me rodeia.
Suspiro no fim de uma lufada de ar...

FIM

19 de novembro de 2007

Canto do mar

sigo o canto do mar como se me chamasse
vou pelos areais finos onde as aves descansam
detenho-me na espuma como se o ar me faltasse
mergulho na maré onde os peixes balançam
ouço o canto do mar como se o mar cantasse
como se o mar cantasse

Dúvida

Seria necessária outra vida para que tivesse tempo de explicar o que os meus olhos vêem e o meu coração sente.
Às vezes penso: e num poema, conseguirei convencê-la do amor?

Antevisão de um eventual fim

se um dia não disser que te amo
será porque o amor seguiu o rumo das aves
e porque nos teus olhos se apagou a palavra etérea.
se nesse dia te deres conta do que já sabes
é porque a noite encalhou numa enseada junto ao mar
e um crepúsculo se despenhou na terra.
se esse dia chegar
não me procures que a minha vida não resitiu à desesperança
e eu segui o caminho do desespero da tua ignorância.

Dia

uma rede fina de névoa segura o azul do céu
descobrimos o mar desde a janela do quarto
o teu corpo eleva-se no meu ondulante como o mar alto
arfantes respirações quebram o silêncio do outono junto ao sol
reatamos os beijos e incendiamos os desejos
e nus sobre a cama branca assistimos ao desenrilhar da névoa
surge um novo dia renova-se o amor que nos conduziu até aqui
agora somos felizes

Noite

a noite está escura.
uma cor negra e estranha apagou as estrelas do céu.
ao longe ouve-se o mar revolto a quebrar o silêncio na charneca.
o meu corpo estremece num abraço apertado que partilhamos.
beijas-me. beijo-te. beijamo-nos.
sobre nós sobrevoa uma gaivota desorientada no breu nocturno.
damos as mãos. apertamos as mãos.
o teu olhar brilha. brilha e ilumina caminho.
amo-te. amas-me. agora sou feliz

15 de novembro de 2007

Acordar ficcionado

Acordei com a tua voz a sussurrar-me ao ouvido na manhã mais longa de todas as manhãs. Acordei imaginando que me acordavas com um desejado "Amo-te". Deixei-me ficar na cama larga submerso num sonho acordado onde eras a protagonista principal. Abracei-te num olhar de desespero, com receio de que tudo se mantenha assim. Com o terror de que tudo se mantenha assim. Mas o que importa é que na mais longa de todas as manhãs acordei com o sussurrar da tua voz e um abraço imaginado com a intenção de não te perder.

Tanto querer

quero o teu olhar
quero-o desesperadamente
como se fosse ar para respirar
quero um beijo também
como se fosse água para matar a sede
quero passear contigo
de mão dada quando o sol vem
e quero o calor do teu corpo antes da madrugada

O Amor de

as aves sobrevoam a noite entre estrelas guiadas pelo luar,
as suas asas são como sonhos que se prolongam na madrugada.
as cidades adormecem no baloiçar das luzes amarelas.
no silêncio da aurora renasce o amor:
o amor de te amar. o amor de te viver.

Agastado

Os dias têm-se arrastado entre o sol baixo de outono e as noites frias. As ruas disfarçam-se com as folhas caídas no chão. Os passos seguem-se aos passos lentos de um outono atípico. As roupas frescas de verão ainda não estão guardadas. Os dias arrastam-se uns atrás dos outros, vagueiam pelo tempo sem que nos demos conta da sua existência. Levamos ao olhar o brilho azul do céu e o negro do barro que nos rodeia. À cidade branca trazemos o suspiro aliviado de um desejo que nos anima. Somos o lugar de uma ilha que se estanca no centro de um mar de planícies. Somos o espaço que se desenha de branco entre as sete cores do arco-íris. Somos o que resta. Somos o que nos deixarem ser.


Na noite prolonga-se o silêncio e o vazio de uma cidade que se aninha nas casas fechadas. Nas janelas de estores corridos. Nas portas trancadas. E nas ruas vazias da noite apenas nós os dois. Apartados um do outro. As mãos não se tocam, os lábios não se desejam. Passeamos pelo parque da cidade enrolados no frio noctivago. Rodeamos o lago raso onde os peixes adormecem junto às luzes submersas. Demoramos num olhar fugidio. Abraçamos o silêncio que construí como um muro alto, não para te afastar, mas para te proteger de mim. Dos meus pensamentos mais fundos e desconexos. Amarramo-nos no cais improvisado. Detemo-nos num silêncio vagabundo nas ruas desertas da cidade branca. Estacionamos o carro numa rua qualquer. Conversamos pausadamente para não quebrar o silêncio. Digo-te nas entrelinhas o que não tenho coragem de dizer frontalmente. Não te quero envolver nas palavras rudes e ásperas que motivam os meus pensamentos. Apenas te posso dizer que os dias se arrastam uns atrás dos outros. Despedimo-nos como o frio da noite. Adormeço na esperança de uma palavra de conforto. Acordo no desejo de um abraço quente que não se dá. Arrasto-me como os dias no silêncio das palavras.


Silêncio! Silêncio! Outra vez o silêncio...

12 de novembro de 2007

Juras de amor

Um final de tarde de outono junto ao mar conduziu-nos num passeio até ao fim do pontão que se prolonga por uma centena de metros mar adentro. Um pescador entretia-se alheado da nossa presença segurando a cana de pesca. Paramos num abraço e depois seguimos num beijo enquanto o mar esverdeado ondulava sob os nossos corpos. Tranquilo, como o final de tarde de outono. Enebriados pela intensa paixão que percorria os nossos olhares seguimos pelo areal húmido desafiando as ondas que teimosamente nos perseguiam. Passo a passo, lado a lado, mão com mão, fomos deixando o nosso rasto de pégadas. Subimos ao topo de uma rocha à beira-mar. Sentamo-nos de frente para o espelho esverdeado e ondulante. Em nosso redor a espuma branca fendia-se na areia molhada. Conversamos com os olhares presos nos olhos um do outro. Fumamos um cigarro de mãos dadas. Senti o seu cheiro misturado com o aroma da maresia. E nos seus olhos apercebi-me do reflexo do mar. E na sua pele suave e macia vi nascer o crepúsculo de um final de tarde de outono. Subimos a rua ingreme junto às casa brancas que abraçam o oceano pela manhã. Paramos num miradouro e sentamo-nos num banco abraçados um ao outro como se fossemos parte daquela imagem. Num olhar damos conta de que trocamos o mar pelos olhos um do outro e silenciamos o ruidoso som das ondas a desfazerem-se na areia pelas juras de amor eterno.

11 de novembro de 2007

Uma tela em branco

Uma tela em branco. A mão direita segura ainda inexperiente um pincel fino e novo. Um olhar de dúvidas sobre o branco da tela. Uma mistura de sentimentos retarda o primeiro traço. Um suspiro fundo e decidido conduz a mão à tela branca. Na base uma cor mais forte e intensa ocupa o espaço branco da tela. Um olhar duvida do resultado... Tudo se pode recompor mais tarde. Há que deixar secar. Na parte superior da tela umas cores mais alegres lembram o seu olhar quando corria até mim. Os pincéis desfiguram-se no arrastar da tinta sobre a tela rugosa. Misturam-se as cores e a tela branca altera-se. Transforma-se. Ganha outra vida como nós um dia sonhamos pintar o mundo com o nosso amor.


Uns passos para trás. Outros para a frente. E neste avanço e recuo dá-se conta do que poderia ter sido diferente. Se a tela branca se transformou porque não poderemos nós mudar? Porque não deveremos desenhar o destino e pintá-lo das cores que desejarmos? Porque lutaremos insistentemente, repetidamente, pelo comodismo das fraquezas? Uns passos para atrás. Outros para a frente. E neste avanço e recuo dá-se conta do gesto de uma mão. A tela já não está branca. Mas estou eu ainda na esperança de que os dias tenham outras cores. De que uma mão me segure e preencha os dias incolores da vida. Pouso os pincéis esgotado pelos olhos semi-cerrados. Sento-me no chão a gastar o olhar até ao fim. Olho a tela colorida onde se esconde em segredo o teu rosto e o teu sorriso. Sorrio também. Os olhos fecham-se definitivamente. Acordo com o som leve de um pássaro no parapeito da janela, a luz da manhã invade a sala e no rasgo matinal do meu olhar uma tela outrora branca ilumina-me.

9 de novembro de 2007

Os dias têm-me agastado os pensamentos. Tornaram-se amargos e densos. Pesados e fundos. Negros. Cobertos de negro. Vou ao desencontro do que quero. Sigo os caminhos opostos do meu desejo. E tudo se resolveria numa palavra. Numa intenção. Desculpa.

7 de novembro de 2007

Fora de tempo

A madrugada desafia-me. Quer levar-me pelo fio de pinheiros altos, quer que seja o luar na noite escura. Digo-lhe que não na convicção de me manter fiel ao sol. Insiste. Repito que não. Volta a insistir. Entre a madrugada escura e o sol brilhante estou como se fosse um ocaso, ou um acaso. Repito o não com veemencia. Insiste. Serve-me um whiskie e ao meu lado uma mulher loira de olhar escuro. Vacilo. Digo que talvez. Partilhamos uma bebida. Partilhamos um olhar noctivago de desejo. Abdico de tudo. A madrugada desafia-me. Sou o mais fraco de todos. Regresso ao passado. Sigo a luz de um candeeiro na estrada junto às árvores. Levo as mãos aos bolsos... a noite está fria. Agasalho-me num casaco fino. A loira segura-me o braço apertando-o no seu corpo. Paramos junto a uma fonte. Abraçamo-nos no frio que a madrugada traz enquanto escutamos o sincronizado som da água a cair no solo fértil. E um beijo surge. E a manhã cresce leve e fresca de amor. Um amor fora de tempo.

4 de novembro de 2007

Poderia ser domingo

Sentado numa esplanada em forma de peninsula sobre um lago raso observo e sou observado. nem dou conta das horas que passam tão entretido com a conversa que brilha no teu olhar. Uns cafés sobre a mesa e uma torrada de fatias finas. Loura e saborosa como gosto. As tuas mãos a ocuparem o espaço sideral enquanto falas com entusiasmo. E eu de pernas cruzadas para te convencer de quem realmente sou. Lanço-te um desafio. Desafio-te para a vida. Dou comigo a dizer coisas que não entendes. Dou por mim a não entender o que me queres dizer. Baralhamos o assunto porque já não interessa aos dois. Convenço-me de que lançei a semente e um dia a ele regressaremos. Convences-te que me convenceste. A esplanada fica vazia. Agora somos só nós os dois e mais ninguém. Uns patos navegam no lago de água rasa ao sabor de uma brisa mais fresca que o habitual. Seguimos a conversa no olhar um do outro. Nas promessas que insistimos não fazer. Nos planos que correm livres e descomprometidos. O sol ergue-se lentamente até que começa a descobrir a tua face delicada e suave. Admiro a tua beleza. Lembras-me um poema que ainda não te escrevi. Decido abruptamente que devemos partir. Interrompo o cigarro que acabaras de acender. Não suporto mais a vontade que contrarias.
O dia está bonito.
Hoje poderia ser domingo e passearmos pelo campo, ou até quem sabe, ir ver o mar. O céu está azul e limpo como gosto. O sol quente e em harmonia. A tranquilidade das ruas sugere que hoje poderia ser domingo. Aqui voltaremos numa outra manhã e fingiremos que é domingo e faremos de conta que nos amamos...

Sem resistência

começa o dia onde não estás
(na luz azul suave do sul que se disfarça de paz).
despeço-me do mar áspero e frio
que me acolheu na tua já eterna ausência.
zigue-zagueio como o leito de um rio.
começo o dia sem ti, sem resistência.

Amanhecer

hoje queria amanhecer no teu regaço,
abrir os olhos e ter a certeza da tua companhia.

hoje queria-te. e era tão só o que queria:
eu, tu e o amanhecer num longo abraço.

3 de novembro de 2007

A morte das palavras

Um aroma invade a atmosfera. Um doce aroma que me enche o peito de frescura. Senti o teu cheiro num abraço à distancia. Continuas longe de mim. E eu longe de ti. Estamos cada vez mais longe um do outro. Resta-me o aroma do teu corpo, o cheiro enebriante da paixão que se arrasta na dúvida de um olhar mais próximo, de um beijo estridente.
Rasguei a madrugada por uma estrada irregular, de curvas acentuadas e estreitas. Fiz-me à estrada na loucura de um desejo: abraçar-te. Vi no céu uma estrela apagar-se. Temi o pior. Estremeci com o terror de te perder. Julguei que o céu se desenharia de negro, no negro das trevas. Mas trazia-te no meu pensamento. Questionei-me se a loucura do desejo seria do medo de te perder para sempre ou simplesmente porque te queria olhar nos olhos uma última vez, para ter a certeza de já não te querer mais. Questionei-me no silêncio de um carro solitário na madrugada escura guiada pelo luar minguante. Uma estrela apagou-se no instante preciso em que o meu olhar se fixou nela.
Percorri quilometros e quilometros confrontando o meu corpo cansado. De um lado e do outro da estrada eucaliptos agigantavam-se como fantasmas que me perseguiam, curvas insinuosas apertavam-me os movimentos corporais. Uma ou outra clareira surgiam de quando em vez para que sentisse a escuridão da madrugada no meu olhar. Ao longe avisto luzes intermitentes que me avisam da posição da cidade onde estás. Abrando a velocidade. Recosto-me no banco. E abrando ainda mais. Decido encostar na berma da estrada para fumar um cigarro antes de te confrontar com a minha presença. Fumo um cigarro e outro logo a seguir. Temo reencontrar-te. Receio que não queiras ouvir a minha voz ou sentir o meu corpo junto do teu. Aterroriza-me o pensamento de já não te querer mais.
Decido não te ver. Dou por mim a sentir-me como um náufrago que morre na praia. Regresso no momento em que o teu aroma se tornava cada vez mais intenso. E assim nasce o silêncio que nos separa. E assim morrem as palavras... todas as palavras de amor.

No horizonte começa o mar

terminamos num abraço apertado de outono
as folhas secas esvoaçam na marginal onde acaba a cidade
levamos as mãos seguras num passeio à beira-mar
os passos sincronizados acompanham a espuma branca que desfalece no areal
paramos num beijo longo que assiste ao crepusculo na linha do horizonte
e no horizonte começa o mar
e nós damos vida ao futuro num abraço apertado de outono

2 de novembro de 2007

Lugar de antes

A cidade está distante. Como nós um do outro. Ultimamente tem sido quase sempre assim. Têm sido estes os meus pensamentos, à distância do teu olhar cresce em mim a amargura fria das noites que passamos separados. Trago-te num retrato apertado junto ao peito e ainda assim os lugares por onde vagueio surgem cada vez mais desertos.

Hoje estou junto ao mar. Os planaltos verdes e rasos prolongam-se até ao azul espelhado da água. Daqui avisto o farol do cabo sardão onde numa manhã fresca vi nascerem flores nas tuas mãos, onde numa brisa fria me aqueceste os lábios com a doçura dos teus beijos.

Por aqui seguia o caminho das férias de verão quando o meu corpo se dava à aventura e corria nas dunas altas, era por aqui que o meu olhar ingénuo de criança desafiava a imensidão do mar. E por aqui cresci dia a dia sem me aperceber dos previlégios e das honras de uns dias de férias. Mas isso era na época das imagens romanticas da vida, era na altura em que o tempo parecia inesgotável. Nesses dias não me ocorriam os pensamentos de hoje. Deixava o meu corpo frágil vaguear nas aventuras arrojadas, em expedições que julgava perigosas. E fui permitindo saborear o presente como se do futuro se tratasse... E aqui estou, à espera de ver nascer a noite junto ao mar. Outra noite que passarei sem ti.
Escolhi uma enseada que me aproxima do farol, temo lá ir para não não me confrontar com outra memória que não a da tua presença naquela manhã que construímos na madrugada dos afectos. E aqui estou, numa fotografia solitária da minha figura, desesperado na dor de não te ter perto de mim. Frustado nos sonhos de uma criança que outrora corria sob o sol tórrido do verão. E aqui estou sempre na esperança do nosso reencontro.

Névoa sobre o rio

névoa sobre o rio
numa madrugada sem ti
ruas ingremes que desafio
à procura de ti
numa antiga ponte de ferro
suspendo o meu solitário coração
e em ti vive tudo o que quero
apesar de dizeres que não